segunda-feira, 28 de abril de 2008

Implosivo

Não há chão de estrelas. Chão de estrelas é ilusão. Chão de estrelas é só ilusão. Há abismo e lentidão e uma terceira coisa oculta na matéria negra. Um pôster. Papel de parede cósmico. Intervenções envenenadas. Intenções envelhecidas. Meninas mimadas. As estrelas. Seu jogo de vida interna. Ira pirada. Piratas siderais. Pirotecnopirataria. E tê-las no meu quintal. O que significam as marcas no céu. Rugas da eternidade. É tê-las no meu quintal. Fugas na verdade. Objetos afinados. Fins-não-lucrativos. Art noveau paraguaja. Guadalupes e galopeiras. A Armação e a Guanabara. Paraíso-purgatório-inferno. Numa noite de outono. No ano novo antes do outro ano. Sempre novo. Ouro brilha naquela. Na tela da janela. O esquadro de uma madrugada zilionária. Uma saudade que se sabe inalterável. Como olhar por outros olhos. Buscando o que só é mais além. Longe de linguagem. Longe do logos. Logo morto. Ligado a tudo que pulsa. Inerte diante da aspereza da vida. Sem pular etapas. Babel deve morrer quando é hora. Babilônia deve sucumbir. Sodoma e Gomorra devem ser lembradas. E Desterro improvisada na laje do aterro. Terror de todos. Tributos e tormentas. Aterrorizado o medo corre. Mas a seqüência existe sem direção. Direto no peito. No lado direito. Ditando uma carta ao vizinho. Sozinho e trancado. Farto da falta que invita. Nativos que bailam. Corpos mortos por antecipação. Pelo silêncio que exala do não. E fala. E me cala. Porque há eus imprecisos nessa sala. E há saldos nunca descontados. Impérios e sinas. Sinais só óbvios no dia seguinte. Objetos enfileirados. Como todo processo vital. Vai ficar escuro. Vão fechar as portas. Vai chover. Vão beber os estoques. E os dados sempre vão rolar. Viciados e sorridentes. Inválidos. No final. A mesma frase. O contorno da luz desviada. A fase em que estamos. A face que se oferece. O furor que nunca consome tudo. O terror que reside uma vez só. O hálito do messias envenenado. Não vim pedir lugar. Nem declamar ou reclamar. Só se vive de realidade. Uma vez. Imitatio dei. Deitem-se os dogmas e abram-se as portas da cozinha. Calendários vencidos vegetam na parede dos fundos. Onde o luto cósmico resiste. Onde reside esse texto. Onde esse hiato manifesto. Onde esse teto sem alma. Onde esse alarme incomum. Onde o tato. Tanto vagar. Tonto o sono eterno. Tenro o aspecto real. Não há magia. Como não há chão de estrelas. Há ilusões e ascetas. Certezas e pérolas. Vilanias de um sol morto. Um deus-sol-morto. Absorto o pirilampo. Em sua imensidão de estrela. Desordenado vaga. Lumescendo em órbita desinteressada. Uma saudade que se sabe desintegrada. Denso afeto de pedra. Tensa tarefa de perda.

juniores

Imagem: Sami. Imploviso. acrílico sobre tela. 50cm x 70 cm. 2008.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Esculpido

Onde andou minha voz. Essa puta maldita. Cansada de promessas de Armagedon. Onde amarrou seus burros. Seus vícios. E uma terceira idade sempre escondida. Quem poliu minha voz. Quem pulou minha voz na sarjeta. E sorriu. Quem empalou minha voz com uma gorjeta. Quem liderou o projeto que a liberou. De mim restaram pregas mortas. Não mais cordas soltas. Morreu o violão. Não mais notas tolas. Eu fui o vilão. E a surpresa gorou na véspera. Espera até o final. Espera teu final. Os fracos dormem mesmo sem sono. E correm todo dia o dia todo. Os fracos adoram o sêmen do dono. E morrem todo dia o dia todo. Menos ela. Que prepara o café. Não sabe de nada. Da força que tem não desconta em ninguém. Não sabe se sofre. Porque não quer saber. Porque não sabe. Porque não precisa saber. Seu nome são muitos. Seus nomes são mantos. Seus dons são santos. E ela apenas prepara o café. Muda de tudo. Em câmera-lenta. É o ensaio perfeito. Insidioso namoro da lente. Mas ela tem decoro. E nenhuma pressa. Ela não existe. Talvez sino. Talvez vitrine. Quem escalpelou minha voz. Quem lhe alterou a vazão. Quem em vôo rasante. Despeça-se o agora. Dispa-se o restante. Dissipe o resgate. Despiste o tirano. Tirando ela. Orgia nunca restituída. Quem seduziu minha voz. Quem amou e torturou. Quem levou-a ao limbo. Pra sempre muda. No espelho de todos os tempos. Quem aquelas mãos que. Quem esculpe o escorrer da lágrima. Pois a voz chora. Desculpa esfarrapada. Permaneça e permaneça. Gesto inalterado. Como grito acenado. Aceitando. Acato e me desarmo. Porque amo. Quem aquelas mãos que. Quem aquelas mãos que. A voz retida em tom sincero. Assevero que morro. Mais que um dia. Morro todo dia. Morto todo o dia. Quem aquelas mãos. A voz retida em som sintético. Anestético tema. Teima minha querida. Teimosia também canta. Ela encanta. Fazendo o café apenas. Dispensa sabor. Catequiza o calor. Despede o freguês. Hoje o dia é só dela. Quem aquelas mãos que. Sintomas de outono. Outro disco voador. Sim. Tomas os comprimidos. Que a voz volta. Que a voz solta. Que a voz arrota. Que a voz torta. Que a voz... morta ela despede-se de si. Apenas o vagar. Não importa a cozinha. Não importa sozinha. O tempo pára por aqui. Em emissões que dispersam. Essa franqueza dita real. Ela persegue a fraqueza. E serve mais café. Quem aquelas mãos que. Quem aquelas mãos que. Desserviços imprestáveis. E o ranço de uma noite lenta. Quando a voz retorna modorrenta. E retoma o controle. E remonta o rancor. E acorrenta o celibato. E solta seu hálito. A voz é só hábito. Mas quem aquelas mãos que. Habito. Quem aquelas mãos. Quem aquelas mãos que. Desisto.